Ser mãe. Hoje sou mais completa. Mas ser mãe forçou-me a olhar para dentro de mim, a conhecer-me melhor e, em última instância, a curar feridas que me toldavam um entendimento mais sereno do mundo. Mas só cheguei lá depois do universo me enviar uma bela duma artrite reumatoide.
Esta é a história de como este dois desafios moldaram a minha visão (em evolução) do mundo e do sentido da vida e contribuiram para o nascimento da Quinta Ecológica da Peneda. Existiram outros desafios, claro, mas para já escolho partilhar estes dois fundamentais. Os outros irão surgir naturalmente, se fizer sentido, à volta da mesa com um copo de vinho na mão depois de um dia bem passado.
Por razões variadas eu fui obrigada a ser «adulta» muito cedo na vida. Talvez com 6 ou 7 anos, senão mais cedo, eu comecei a ter que ser independente e desenrascada, num lar em que éramos 3 irmãos, uma mãe dedicada com os seus próprios desafios interiores, desempregada e a lutar diariamente pela vida de um filho, meu irmão, com crises constantes e severas de bronquite asmática, e um pai abjeto que, bendita a hora, lá acabou por sair de casa. O dinheiro era pouco, mas a vida com a mãe e irmãos era feliz, sempre fomos unidos. Tínhamos a alegria de estarmos juntos e um sólido conjunto de valores: cuidado e solidariedade, honestidade e verdade, que nos mantinha orgulhosos de quem éramos. Ao mesmo tempo, sempre me foi incutida a ideia de ser muito boa aluna, brilhante, se possível, em tudo o que fizesse. Isto exacerbou as minhas tendências naturais de autoexigência e independência, que se associaram à minha capacidade natural de fazer muitas coisas ao mesmo tempo, de modo a que, quando nasceu a minha filha mais velha, uma criança-anjo, foi o caos.
Esta minha filha só queria colo, beijos e abraços. Só queria estar perto, abraçar… e se tentava evitar que estivesse sempre colada, agarrada, dependente de mim, ela ficava altamente perturbada. E chorava, chorava imenso. Quando bebé não dormia mais de uma hora seguida, de dia e de noite, quase até aos 3 anos. Interessante, não? E eu irritava-me e apetecia-me empurrá-la para longe, quase com aversão e receio de tanta dependência. Eu, a independente autossuficiente, sobrevivente, adulta desde os 6 anos. Pois.
Ao mesmo tempo, eu tinha um trabalho que eu adorava, mas que estava a ser contaminado pouco a pouco pela entrada de valores que não eram os meus, a par de uma exigência em temos de volume e ritmo de trabalho que não eram saudáveis, como se veio a confirmar.
Andava eu a tentar ser mãe de 2 crianças e a liderar uma equipa de várias pessoas num contexto de trabalho exigente e que estava a mexer com os meus valores de base, dos quais nunca abdiquei, aceleradíssima com mil frentes, quando o Universo decide que eu estava a precisar de parar e refletir. E dado que não parava voluntariamente, atirou-me com a doença da imobilidade: a artrite reumatoide.
Acreditem: a artrite reumatoide era única maneira de me parar.
Reparem: desportista, vegetariana, jovem mãe, carreira de sucesso, e sempre fascinada pela vida e pelo mundo, acelerada e claramente a entrar em colapso sem o perceber.
A artrite reumatoide pára tudo. Até doem os cabelos, acreditem. E no meu caso desenvolvi a forma galopante da coisa. Os médicos até olhavam para o lado quando viam as minhas análises. Em pouco tempo quase deixei de andar. E foi aí que, exatamente a característica pessoal que me pôs doente foi a que me permitiu colocar a doença em remissão sem tomar imunossupressores: obstinação.
Demorou 3 anos. De dor e enfrentar fantasmas pessoais. E o resultado foi um crescimento pessoal imenso. É preciso dizer que foi a infinita dedicação ao meu extraordinário companheiro, que merece um texto só dedicado a ele com todas as razões porque o amo, e o instinto de ser mãe que me deram determinação para tal.
Desde o início que eu não quis tomar imunossupressores. A ideia da medicina convencional é baseada na ideia de que se o teu sistema imunitário está a atacar o teu próprio corpo e a destruí-lo, então há que dar uma «paulada» no teu sistema imunitário para ele te atacar menos. (??!!) Isto para mim não era inteligente. Eu pensava que se o sistema imunitário tinha começado a funcionar mal, era importante perceber porquê e restabelecer o equilíbrio o mais cedo possível, dando-lhe condições para voltar a funcionar bem. Para tal, eu não tomava imunossupressores, nem analgésicos, nem anti-inflamatórios, pois queria ouvir o meu corpo e perceber o que ajudava e o que não ajudava. Pesquisei, li livros, adotei a mesma abordagem que sempre adoto na vida: coligir informação e confiar no meu extraordinário cérebro, intuição e no Universo, para encontrar o caminho certo.
Cedo percebi que o sistema nervoso comanda o sistema imunitário e que o intestino é o centro de saúde do corpo. Fiz shiatsu, testei as intolerâncias alimentares (era intolerante a quase tudo), aprendi imenso sobre alimentação saudável, desde alimentação viva a fermentados, passando por ervas silvestres até pão de massa mãe e germinados, comecei a meditar (obrigada, Awakened Life Project), adotei o Pilates como forma de recuperação e manutenção física (obrigada fisiterapeuta Paulo, Sentir Saúde), e descobri, através da maravilhosa Dra. Cristina Sales (Cristina Sales, medicina funcional integrativa), a relação entre a Vitamina D e as doenças autoimunes. Ao mesmo tempo abracei várias formas de ir ao mais fundo de mim, para o que foi basilar a terapia corpo-espelho que fiz com o maravilhoso Rui Leal, uma experiência que ainda hoje trago junto ao coração, a qual me foi sugerida pela minha querida naturopata e especialista em Iridologia, Noémia (Contacto Holístico).
Enfim, tudo isto fez com que me conhecesse melhor e resolvesse vários assuntos interiores, e me libertasse de padrões que tantas vezes nos prendem na vida, oportunidades para avançarmos, só que tantas vezes não sabemos como.
Entre o tanto que ganhei, importa partilhar que recuperei a criança que andava perdida dentro de mim à minha procura, e que isso me permitiu abrir verdadeiramente os braços à minha filha criança-anjo, e acolhê-la sem medo por ela, com confiança na Vida, no Universo. E assim ela surgiu à minha frente amorosa, confiante, sempre disponível para dar amor, mas sabendo o que quer, autónoma perante quem é, o que sente e o que acredita.
Quando se abre os braços à Vida, ouvimos atentamente e tomamos atenção, desenvolvemos a intuição e começamos realmente a cumprir a nossa missão de Vida.
Não tendo sido criada em nenhum tipo de religião organizada, eu tenho imensa fé. Fé em que somos todos almas em evolução, a aprender e a celebrar cada conquista nesta existência terrena, neste paraíso que é o planeta Terra.
De tal modo eu me identifico com esta ideia, que me maravilha imaginar a comunhão de seres que devem existir, a cada momento do tempo e espaço, seres vivos humanos e não humanos, seres imaginários e simbólicos, espíritos, seres em potencial ou memórias de seres que o foram. Imaginam a riqueza dos discursos possíveis num Universo em que o tangível e o intangível se encontram? Não vos excita as infinitas possibilidades de luz e aprendizagem?
Intuo e agradeço toda a beleza do milagre que é a Vida, e no silêncio procuro compreender a minha missão e abraço-a com dedicação e amor.
Assim nasce a Quinta Ecológica da Peneda, salto para o infinito, prova de fé, tão arriscado no plano prático da vida «tal como a conhecemos», tão incontornável para de facto abraçar aquilo que acreditamos ser a nossa missão de vida e que é, agora, parte da missão da Quinta.
Elisabete Alves
O que é Quinta Ecológica da Peneda?
– É um espaço dedicado a cuidar da natureza e das pessoas, sem esquecer nunca que as pessoas também são natureza, e que aqui todos os seres se nutrem mutuamente e vivem em comunhão.
– É um espaço para acolher pessoas e estar com elas, cuidando-as e oferecendo-lhes um tempo e um espaço para se ouvirem no seu silencio interior e encontrarem novos caminhos, ou novas formas de caminhar, ou apenas para parar, e sempre para celebrar.
– É um espaço para cuidar da alma, mas também do corpo, com comida produzida maioritariamente na Quinta em modo de produção biológico (certificado), confecionada com conhecimento e amor.
– É um espaço para viver novas experiências e celebrar «a arte do encontro, quando há tanto desencontro nessa vida» (Áhh! Querido Vinícius de Moraes…). Celebrar como só os portugueses o sabem fazer. Com risos, abraços, música, comida e vinho. Com emoção, com amizade, com o coração.
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